segunda-feira, 11 de dezembro de 2017

Terezinha e a neve

Ao lembramos bom sinal

Como a neve inusual
Caindo alegre à natureza,
Vemos tua alma virginal,
Tereza, em doação total
À eterna Realeza.

Não era duro inverno frio
A arrancar-nos arrepio,
A neve veio de presente.
Para ti, em pleno estio,
Ela ao claustro então caiu
E fez tua alma bem contente.


















A brancura d’açucenas
 A neve imita mui serena
Alegrando o coração.
Pois na célica morada,
Feliz, a alma enamorada
Busca paz, consolação.

Caía a neve nos telhados,
Nos canteiros penhorados
Com beleza hibernal.
“Jesus atendeu o meu pedido,
Há branco lá fora, no meu vestido,
Para a festa nupcial.”

Ouve, ó doce Terezinha,
Usei recursos que detinha,
Pobres para te exaltar.
É maneira própria minha
De fazer-te louvaminhas,
Quis com isso te alegrar.






















Pra fechar o recital
Que não é substancial
O bastante à tua altura.
Rogo que sejas radical,
Me ajuda a sair do mal
Que mantém minha alma impura.

Então, te cantarei, à neve
Que caía bastante leve
Nos teus divinos esponsais.
E por bondade aí me leves
Àquele que te trouxe neve
Das paragens eternais.



Urus na tarde


Ouvi as aves a cantar
Laudes co’o tocar dos sinos
Na tarde que termina o dia
São urus que vem saudar
A Virgem nos longes vespertinos
Em tom de prece ou salmodia.

Como interpretar unção
A envolver o seu cantar,
Donde vem iniciativa?
Acompanho a oração
Que me vejo a escutar.
Por que seu canto nos cativa?

Toda tarde à mesma hora
Fazem prece e homenagem
À Rainha gloriosa.
Entoam hinos à Senhora
Entre o resplendor selvagem
E as plantas olorosas.


Se mostram tal comportamento
Em vespertino declinar
Algo bom me diz natura.
Dos urus ensinamento
Quero humilde replicar
Fazendo odes à Mãe pura.


















Mãe Assunta ao Paraíso,
É rainha para humanidade,
Ganhou do Filho a realeza.
Coração compadecido,
Coração de tal bondade

Que toca urus na natureza. 

Serra do Mulungu, morro da lembrança



Que mistério, que saudade
Sinto dessa majestade
Que vem da Serra Mulungu.
Nós subíamos a ladeira
Entre verdes capoeiras,
Onde há tocas de tatu.


Aves aqui, outras acolá,
Juritis e sabiás,
Sonorizam a verde brenha.
Lá no alto estão bandeiras,
Ramos saindo à cordilheira,
Qual penacho para as penhas.






Que se contempla até alturas?
Morros, áreas com culturas;
Rompendo o mato, bananeiras.
Mas apuro meus ouvidos
Vozes tenho cá sentido,
Meninos vêm com brincadeiras.

Que fazem com alacridade,
Neste espaço de liberdade?
Caçam frutas, as cortiças.
Trazem das mães as encomendas,
Batatas, alecrim, amêndoas,
O resto? É curtição, preguiça.

Cortiças peço a um piá:
“Me passa maduras para cá”,
Mas responde bem maneiro.
“Se queres milho para assar,
Tenho espigas, é só levar.
E tacá-las no braseiro.”







Na verdade tinham ido
A um trecho conhecido
Pelas ricas bananeiras.
Eram logo abaixo de peraus.
Nesse lugar mais aquecido
Cresciam cachos bem nutridos  
Ao café colonial.

De retorno, rapaziada
Dava certa esticada
Aos capões da redondeza.
Guris buscavam por cortiças,
Eram sim o gosto e cobiça
Que atiçava afoitezas.

Quanta recordação eu tenho
Cá passando por copa e lenho,
Trazendo cachos pra madurar.
Em jornais amaduradas,
As bananas à chapa assadas
Iam ao pão pra alimentar.

“Temos bananas já maduras,
Que são uma gostosura,
Leva algumas pra comer.”
Agradeço tal fineza,
Terei fome com certeza,
E este lambisco não vou perder.


De novo miro a montanha,
De bom verde se engalana
E a estrada é de lembranças.
Cruzam-se muitos conhecidos,
Comentam fatos ocorridos,
Há males, mas vence a esperança.







Despedida com recados,
E lembrança pra todo lado
Sob grandiúvas e ingás.
“Mande lembranças a Maria,
Que jamais esqueceria”,
Confidências é que há.


“Mande lembrança ao João
Que não vejo faz tempão”,
Mando lembrança a esta terra.
Vou subindo não sozinho,
Ouço sim os passarinhos,
Água sussurrante à serra.

Que alegria, o Ramalino,
Que não vejo desde menino,
Vem chegando aqui na estrada.
“Grande velho, tu não muda,
A cara nunca tens sizuda,
Sempre pronto pra risada.”

E Ramalino retrucou,
“Tu já viu ou escutou
Que tristeza não paga faturas?
Assim eu vivo bem contente,
Com a cara sorridente,
Vou driblando a desventura”

Hoje, seus filhos são crescidos,
Já estão "distribuídos",
Um foi a Brusque trabalhar.
Outro mais longe se fixou,
Faz tempo, ao Paraná mudou
Para a vida lá ganhar.

José Buss depois lembramos
E dona Verônica louvamos,
Grande parteira do lugar.
De lembranças grande lote
Nós tecemos de galope
Para em dia as colocar.

Pelo Nelson estou passando,
É dos Merten, estou lembrando,
E caçador de passarinhos.
“Hoje mudei de opinião,
Deles tenho compaixão,
Só recebem meu carinho.”  











“Nem posso me lembrar”, me fala,
“Das pelotas e das balas
Pra matar os infelizes.
Hoje admiro seu cantar
Tenho gosto em contemplar
As saíras e perdizes”.

“Quem diria”, falo após,
“ Que tu aqui nos cafundós,
És defensor da natureza”.
“E ensino à criançada
O amor à passarada”,
E eu: “A vida tem surpresas”.











O Nelson agora provoquei:
“Qual dos pássaros é rei”?
“Para mim é rei o nhambu.
Seu trilo é lindo, muito forte,
É ouvido de sul a norte,
Supera macucos e jacus”.

Bravo, bravo. Sigo à serra,
Que mistério ela encerra.
Seu silêncio é eloquente.
Vejo as casas, as pastagens,
Roças a pintar paisagem,
Detalhes a evocar as gentes.

No alto céu está montanha,
Horizontes me acompanham
Na subida ofegante.
Das copadas altaneiras,
E das sangas cantadeiras
Vem apelo extasiante.

Evoco a serra da Barriga
Tão ligada a toda a vida
Do Poeta Jorge de Lima.
Serra esta painel de fundo
Em sua descrição do mundo
Onde infância enfim sublinha.



















Em ti recolho nostalgia,
Ó magnífica serrania,
Que para o alto nos convidas.
De lá que prorrompia a chuva
Em cortinas, em catadupas,
Sobre almas contemplativas. 

Que direi dos paredões
Que tem os ramos por pendões,
A eles um canto de saudade.
Da gente amável e querida,
Da natureza mui ferida
Hoje, eu louvarei bondade.

Não sei de fato até que ponto,
Essa alta ladeira agora monto,
No céu revoa o tesoureiro.
Abano lenço para a serra
Para a gente desta terra,
Pois de ambas sou troveiro.

Mas dobrando o espinhaço
E sofrendo com mormaço,
Tenho a via à catarata.
Finou o morro da Lembrança,
Agora é água da Lembrança,
Haja perna pela mata.

No profundo socavão
Vai descendo o ribeirão.
Que surpreendente visual.
De repente vemos véu
Com vapores indo ao céu.
Água em pedras, que festival.

Preocupações, estresse
Com a correnteza descem,
Prevalece o esplendor.
Águas, morro da Lembrança,
Em meio a vós eu fui criança
Sou o vosso trovador..