segunda-feira, 17 de agosto de 2020

À pastagem na paisagem

Sei que mundo que vivi

Nesta pastagem, à beira-rio

Não existe, teve seu tempo.

Quer dizer, existe sim

De outro modo ou versão

Com que ora o contemplo.

 

Árvores remanescentes

Nos acolhem sorridentes

Acenando para o azul.

Têm alegria em nos ver,

Oferecem a arte da copa,

A beleza a embevecer.

 

Eis aqui tangerineira,

Seus frutos nos deliciam

Quando inverno nos judia.

Galhos com suas espinheiras

Não nos fazem desanimar,

As frutas são pra desfrutar.

 

Posso estar a alguma leitura,

A algum trabalho penoso.

Não importa, a tangerineira

Tem os frutos de gostosura

E no temporal da chuva

É amiga verdadeira.

 

Tão basta, tão densa é sua copa

Que as vacas e  suas crias

Ali se acolhem e refugiam.

Praticamos a mesma moda,

Quando chove. Aí nos vemos,

Esperando que  tempo estia.

 

Se ficasse só na tangerina

Eu seria muito ingrato

Com as outras na pastagem,

Como o coqueiro com coquinhos

Ao gosto bom da molecagem,

Eta cacho madurinho.

 

Mas a fome não é só essa,

Há tantas outras promessas

Nas galhadas ganhando o ar.

Mostram-nos também beleza

Há quem diga esbelteza,

É forma para bem louvar.

 

Ouvido tem as suas maravilhas

Com o canto do passaredo.

Eis o bem-te-vi que ledo

Chama os outros pra notícias:

“Eu vejo o sol que alumia,

Eu canto o sol que dá alegria”.

 

Posso estar amargurado

Com assuntos a resolver,

Contas, casos a remoer.

Mas nesse passo sou alertado

Por este céu e verde prado,

Eu só tenho a agradecer.

 

Podes-me interpelar:

Em que mundo estás a cantar.

Existe mesmo, nele estás presente?

É apenas filme em minha mente.

Plantas, ou idosas morreram

Ou ceifou-as mão inclemente.

 

Dádivas fez-me a natureza

Desde albores de meus anos,

Desde aurora da minha vida

Todos têm o seu ipê,

O seu pé de gabiroba

Ou bromélias pelos ramos.

 

Ocorre que amados primores

Que tivemos nos verdes anos

Já sumiram da existência.

Mas inspiram trovadores,

Que por verso iluminado

Compensam a dor e a ausência.

 

Eu andarilho na pastagem,

Respiro o verde da paisagem.

Mas quem lhe dá mais charme

É rio com suas corredeiras.

Com seu canto, me permitam,

Eu termino a brincadeira.

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