segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Meus pinheiros de volta

Me sinto um pouco surpreendido

Com as broncas de Bandeira

Ante a reformada Recife.

Haviam desaparecido

De sua cena costumeira

Praças, ruas da meninice.

 

“Revi ontem meu Recife.

Está de fato completamente mudado.

Tem avenidas, arranha-céus.

 É hoje uma bonita cidade”

E o poeta descontente:

“Quem pôs bonita a minha terra?”

 

Louvado nessa reação

Ponho-me a reclamar

De destruído ambiente.

Para fim d’iluminação

Pede-se fiação passar

Num sítio nosso conveniente.

 

Ao pai pediram anuência

Pra passar em nossas terras

Com os fios d’alta tensão.

Assim, em rápida diligência

Viria luz às casas da serra,

Essa foi argumentação.

 

Não estive pessoalmente

Em casa nessa ocasião.

Quando soube, já passara a luz.

Negociação esteve ausente

A qualquer indenização:

Ato gratuito se produz.

 

Mas não gratuita foi passagem,

Árvores foram derrubadas,

Raios podiam atrair.

Meus pinheiros na aragem,

Em toda esta empreitada,

Logo foram ao chão cair.

 

Pinheiros seriam até poupados,

Se serviço de fiação

Deles se afastasse mais.

Mas não tiveram tal cuidado

Para minha decepção,

Lá se foram meus pinhais.

 

Nós outros de boa vontade

Fornecemos gratuitamente

Terreno, mata e capoeira.

Bela generosidade.

Cadê os pinheiros resplendentes,

Cadê as aves cantadeiras?

 

Caso meu não é isolado

Na brasileira sociedade,

Eu constato tristemente.

Institutos do estado,

Poderosas entidades

Maltratam o meio ambiente.

 

As grandes, nobres seringueiras,

 Antiga renda nacional,

Cedem à soja, e às pastagens.

Na Amazônia, a mil maneiras,

No fogo à mata tropical,

Se mata a grã diversidade.

 

Critico não só as grandes obras

No seu desejo de enricar

À custa da mãe natureza.

Broncas igualmente sobram

Aos que paineiras vão matar

Por queda das folhas. Que crueza.

 

Muitos outrora ao chão catavam

Nos seus quintais e seus pomares

O fruto chamado Cambuci.

Hoje só Paranapiacaba,

O embala nos seus ares

Para o gosto dos guris.

 

Num anelo derradeiro,

Busco só consolação

Para meus restantes dias.

Quero de volta meus pinheiros,

Quero d’aves a canção

Com seu trino e melodias.

 

Devemos não só recriminar

Ambiente depredado.

Também zelar pela Criação.

Pinheiros vamos contemplar

Com canários lá pousados,

Crianças a colher pinhão.

 

Bem pode ter acontecido

De perderdes vida afora,

Bosques, plantas de muita estima.

Não fiqueis entristecidos:

Meus pinheiros têm aurora,

Canto-chão nas verdes cimas.                       .     

 

No entanto, é bom pensar

Em restaurarmos natureza,

Cultivando a plantação.

Teus pinheiros vão voltar.

Terás matinas de beleza,

E a gralha, o seu pinhão.

 

Meus pinheiros não mais existem.

Vou chorar? Gritar pelos campos?

Do meu choro eu fiz canção.

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